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Aqui procuro falar de forma simples a respeito de assuntos que de alguma forma tangem à Geografia. Sim, a Geografia que por muitos é considerada simples decoreba, chata e ainda sem sentido. Não quero provar nada, apenas demonstrar que a Geografia está presente em coisas simples e que no final torna-se de essencial importância entender um pouco sobre a organização da sociedade no espaço. O Espaço, um dos conceitos fundamentais da Geografia e é nele que você vive, se reproduz e assiste a vida passar, exatamente neste palco chamado Espaço.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Habitação Social - de Carlos Vainer

Habitação Social: a solução existe e está ao alcance da cidade

Carlos Vainer

Professor Titular do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional/UFRJ

ettern@ippur.ufrj.br

Rio - Fundado por Estácio de Sá em 1º de março de 1565, no morro Cara de Cão, o Rio de Janeiro passou há dois séculos por uma refundação, quando aqui desembarcou a Família Real Portuguesa. O PR pintado nas fachadas de muitas casas indicavam que estas casas seriam ocupadas por um integrante da corte. PR queria dizer Príncipe Regente, mas o povo, ironicamente, tinha outra versão para as duas letras: “Ponha-se na Rua”. A verdadeira fundação da cidade moderna, porém, aconteceu há pouco mais de 100 anos, quando, sob o comando do prefeito Pereira Passos, foi aberta a Avenida Rio Branco - então, Avenida Central. No que ficou conhecido como “bota-abaixo”, cerca de 600 prédios foram demolidos e milhares de pessoas foram expulsas para a periferia da cidade ou se estabeleceram em morros próximos ao centro.

Não seria exagero afirmar que, no século XX, um dos traços marcantes da urbanização carioca foi o processo de expulsão dos pobres das áreas centrais, em direção à periferia e às favelas em expansão. Nos anos 50 e 60, o boom imobiliário da Zona Sul exerceu enorme pressão sobre várias favelas, exacerbando o processo de remoção. Sob os governos de Carlos Lacerda e, com o início da ditadura militar, de Negrão de Lima, a destruição de favelas e a remoção de seus moradores se impuseram. Expulsos das áreas em processo de valorização imobiliária, os mais pobres eram literalmente jogados em conjuntos habitacionais na periferia distante.

Em pouco tempo, revelaram-se os efeitos dramáticos do que se havia concebido como “solução final” para as favelas - pelo menos aquelas da Zona Sul. Segregados e distantes do mercado de trabalho, os grandes conjuntos habitacionais se degradaram, agudizando o empobrecimento de seus moradores. O filme Cidade de Deus narra o resultado deste perverso processo de remoção de favelas.

A partir dos anos 1980, em conseqüência das lutas populares que marcaram o fim da ditadura militar, afirmou-se progressivamente a convicção de que bairros populares precários e favelas não deveriam ser removidos, mas urbanizados, dotados de infra-estrutura e equipamentos sociais. Além de consagrar o direito cidadão à moradia digna, segura e salubre, a Constituição Federal de 1988 afirmou o dever do Estado de planejar e executar políticas habitacionais que viessem suprir as necessidades das populações de baixa renda.

Como em muitas cidades brasileiras, no Rio de Janeiro os governos têm sido omissos no desempenho de suas obrigações constitucionais. Alguns programas de urbanização de favelas promoveram melhorias localizadas, mas, na prática, nas últimas duas décadas, nos níveis federal, estadual ou municipal, nada houve que merecesse ser chamado de Política Habitacional. A conseqüência foi a precarização e crescimento das favelas, apesar da queda da taxa de crescimento demográfico. O recente programa federal “Minha Casa, Minha Vida” é largamente insuficiente do ponto de vista quantitativo, além de pecar por reproduzir a fracassada experiência de periferização da pobreza, afastando os trabalhadores do mercado de trabalho.

Ao mesmo tempo em que se mostravam incapazes de implementar Políticas de Habitação Social, os governos fizeram, desde 1970, vultosos investimentos para viabilizar a especulação imobiliária na Barra da Tijuca. Os túneis, viadutos, auto-estradas e infra-estruturas que valorizaram as terras de uns poucos latifundários urbanos são a contra-face da ausência de investimentos em habitação social. Mais recentemente, a Cidade da Música e o Engenhão mostram como se desviam recursos públicos daquilo que deveria ser prioridade: habitação social.

Agora, quando a tragédia de centenas de mortes e milhares de desabrigados denunciam a omissão e irresponsabilidade das elites dirigentes de nossa cidade, estas não têm nada a oferecer a não ser a velha solução final do lacerdismo, do bota-abaixo de Pereira Passos, do ponha-se na rua de D. João VI. Só falam em remoção.

Mas a cidade tem muitos e valiosos recursos para que, finalmente, leve adiante uma vigorosa política habitacional. Milhares de imóveis ociosos estão à espera de que se lhes imponha o cumprimento da função social da propriedade, determinada pelo Estatudo da Cidade (Lei 10.257/2001). Várias centenas de imóveis públicos, inclusive na Área Portuária, podem ser destinados à habitação popular, em conformidade com a Lei 11.124/2005, que instituiu o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e determinou a destinação de imóveis públicos para este fim.

Prevenção e habitação social são a solução e ela se encontra ao alcance da cidade. A sociedade deve e pode construir a vontade política que imporá esta solução aos governantes.


FONTE: http://odia.terra.com.br/portal/rio/html/2010/4/habitacao_social_a_solucao_existe_e_esta_ao_alcance_da_cidade_76035.html

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